TEMPO DE PRANTEAR E TEMPO DE DANÇAR

TEMPO DE PRANTEAR E TEMPO DE DANÇAR

Meditações no Salmo 30

Wicliffe de Andrade Costa

Texto para leitura: Salmo 30

Salmo. Cântico para a dedicação do templo. Davídico.

1 Eu te exaltarei, SENHOR,

pois tu me reergueste

e não deixaste que os meus inimigos se divertissem à minha custa.

2 SENHOR meu Deus, a ti clamei por socorro,

e tu me curaste.

3 SENHOR, tiraste-me da sepultura;

prestes a descer à cova, devolveste-me à vida.

4 Cantem louvores ao SENHOR, vocês, os seus fiéis;

louvem o seu santo nome.

5 Pois a sua ira só dura um instante,

mas o seu favor dura a vida toda;

o choro pode persistir uma noite,

mas de manhã irrompe a alegria.

6 Quando me senti seguro, disse:

Jamais serei abalado!

7 SENHOR, com o teu favor, deste-me firmeza e estabilidade;

mas, quando escondeste a tua face, fiquei aterrorizado.

8 A ti, SENHOR, clamei,

ao Senhor pedi misericórdia:

9 Se eu morrer, se eu descer à cova,

que vantagem haverá?

Acaso o pó te louvará? Proclamará a tua fidelidade?

10 Ouve, SENHOR, e tem misericórdia de mim;

SENHOR, sê tu o meu auxílio.

11 Mudaste o meu pranto em dança,

a minha veste de lamento em veste de alegria,

12 para que o meu coração cante louvores a ti

e não se cale. SENHOR, meu Deus, eu te darei graças para sempre.

O uso coletivo do salmo, conforme o seu título original (“Cântico para a dedicação do templo”), indica que o seu caráter extremamente pessoal foi reinterpretado, transformando-o em caso geral. O salmo mostra-se como um cântico em que a nota dominante é a ação de graças.

1. A EXPERIÊNCIA DO SALVAMENTO DIVINO (v. 1-3) – O salmista está exultante. Acaba de experimentar a salvação de Deus, que o livra de um estado diante do qual se sentia impotente. Uma grave doença o colocou às portas da morte, de onde clamou pelo socorro divino. Agravando o sentimento de impotência, existia a pressão dos inimigos, que, durante a situação, atacavam a fé do salmista.

A confiança no SENHOR não é em vão. Abatido e sentindo-se como morto, o salmista é reerguido pela poderosa interferência do SENHOR e devolvido à vida. Os sentimentos de alívio e de alegria fundamentam sua decisão inicial de exaltar o SENHOR, o que é cumprido diante da comunidade.

2. A CERTEZA DO FAVOR DIVINO (v. 4-5) – Inteiramente de acordo com a natureza do pacto do Antigo Testamento, a experiência pessoal de Deus vivida pelo indivíduo não pertence exclusivamente a ele. IAVÉ é o Deus que fez uma aliança com o povo, portanto a experiência do indivíduo deve ser levada à comunidade para a exaltação do nome do SENHOR. Na dimensão pessoal, são apresentadas as razões do louvor (v. 2-3). Agora, na dimensão comunitária, as constatações nascidas da experiência pessoal são transformadas em verdade para todos. Com a experiência que o levou às lágrimas, aprendeu que o fundamento da vida é a graça de Deus. Como a escuridão não consegue se impor diante da luz da alvorada, também o choro não consegue deter a alegria que irrompe quando se sente o favor constante de Deus.

O salmista volta, então, à sua experiência pessoal (vers. 6-10).

3. A LEMBRANÇA DA LIÇÃO DIVINA (v. 6-7) – As circunstâncias foram tão favoráveis que o salmista esqueceu sua dependência de Deus. Em sua autoconfiança, pretendeu prolongar para sempre o sentimento de segurança (v. 6). Em sua graça, Deus ensina uma lição ao salmista, fazendo-o perceber que é ele quem de fato garante sua segurança.

O favor divino não sofre interrupção (v. 5) e, em meio a ele, irrompe a ira de Deus, que tem em vista desviar o homem do caminho errado para o caminho certo. Foi suficiente o SENHOR esconder sua face para o salmista cair em si. Diante do colapso de toda segurança humana, esse homem se conscientiza de que a vida depende totalmente de Deus. Como tantas vezes na vida, o leito das dores leva também o salmista à reflexão e ao exame de consciência, resultando em modéstia, humildade e gratidão. Ele vê na doença a ira de Deus que o castiga para que reconheça seu pecado – autossuficiência – e se volte para Deus.

4. A EXPECTATIVA DO AUXÍLIO DIVINO (v. 8-10) – Consciente de sua falência e confiante no auxílio divino, o salmista clama pela misericórdia do SENHOR. Tendo aprendido a lição – é o favor de Deus que dá firmeza e estabilidade (v. 7) –, o salmista quer ser mantido vivo para proclamar a fidelidade do SENHOR. A conscientização do favor divino adquirida na crise veio acompanhada do desejo de dar testemunho da graça de Deus tal como agora experimenta.

Esse argumento (v. 9), no entanto, é deixado de lado e o salmista volta à sua condição de pedinte (v. 8 e 10) que, em sua fraqueza, apela à misericórdia de Deus.

A ira de Deus atingiu o seu propósito: trazer o salmista de volta.

5. O PROPÓSITO DA TRANSFORMAÇÃO DIVINA (v. 11-12) – Deus ocultara sua face (v. 7) para que o poeta reconhecesse que o favor divino é o fundamento em que se assenta sua vida. Agora, aprendida a lição, o SENHOR transforma radicalmente a sua condição, definida por termos contrastantes.

O pranto é mudado em dança, expressão de alegria em vários episódios da Bíblia (Êx 15.19-21; II Sm 6.12-15). A doença e a pressão dos inimigos o prostram em um estado de constante lamento. Mas, pela ação do SENHOR, o saco amarrado com uma corda é substituído por uma veste festiva. E o salmista ratifica um aspecto da lição aprendida: o propósito da salvação é a exaltação do nome do SENHOR, incluindo o louvor a Deus, a proclamação da sua graça (não se cale, v. 12) e a gratidão contínua (darei graças, v. 12). O louvor expressa-se na efervescência da dança, mas também tem profundidade (parte do coração, v. 12) e persistência (para sempre, v. 12).

Para pensar – “Somente quem te abandona pode perder-te. Mas para onde irá ao abandonar-te? Para onde fugirá, senão para longe de tua bondade e para perto da tua ira?” Santo Agostinho (354-430).

Para orar – “Sempre estavas presente em tua severa misericórdia, entremeando de amargos desgostos os meus prazeres ilícitos, a fim de que eu aprendesse a procurar a alegria sem ofender-te. Se eu tivesse encontrado, só teria encontrado a ti, Senhor, que nos dás a dor como preceito, que feres para curar e nos tiras a vida para não morrermos longe de ti.” Santo Agostinho (354-430).Para guardar – Segurança própria X Segurança em Deus.

OBSERVAÇÃO: Esta meditação faz parte do livro “Intimidade com Deus: meditações nos Salmos”, que você pode adquirir com o autor. Contato: <wicliffecosta@ufrnet.br>.

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